Antigamente tudo era diferente. Menino brincava com menino e menina brincava com menina. Algumas brincadeiras coletivas se podiam misturar meninos com meninas, mas em brincadeiras específicas de meninas, menino que se metesse a participar, era visto pelos demais com desconfiança, os quais já passavam a buscar naqueles trejeitos efeminados. Por outro lado, menina que se metesse em brincadeiras de meninos, como jogar bola por exemplo, já era vista como possível “menina homem”.
Depois da escola as brincadeiras corriam soltas, cada qual no seu quadrado. Lembrando que a tudo se obedecia a normas e horários estabelecidos pelos pais.
Mas chega o tempo em que algumas mudanças começam a ocorrer. Nos meninos, primeiros pelos nas axilas e no púbis, a voz se modificando e se tornando graves, e os olhos passam a ver as meninas com um olhar diferente. Algo está acontecendo. As meninas desenvolvem seios e curvas, os meninos percebem que suas partes íntimas modificaram e a simples visão de um decote mais ousado é motivo para se esgueirarem para um canto reservado e a custa de devaneios e fantasias arfarem ao desejo que nem entendem o significado. É o furor de hormônios em profusão, estimulando a libido em evolução aguçada por imagens que desencadeiam o prazer solitário.
Doravante reuniões de meninos não são só para brincadeiras inocentes. Discutem entre si suas experiências com as primeiras descobertas. Os interesses pelas meninas já não são por brincadeiras, e sim pelo desejo de sentir calor da pele, do prazer.
Certo dia meu primo chegou para mim e disse: “Hoje vou te levar em um lugar”. Perguntei aonde era esse lugar e ele disse: “Você vai gostar”. Passei boa parte do dia imaginando o que seria. No final da tarde ele me chamou e fomos juntos.
Era um casarão antigo e ao chegarmos algumas moças nos receberam cumprimentando meu primo. Algumas olhavam pra mim com sagacidade nos olhos. Fiquei apreensivo. Meu primo disse para as moças: “É meu primo! Mais virgem que Nossa Senhora. Quem quer iniciar o rapaz?” Uma morena se apresentou sorridente e disse: “Deixe que eu cuido desse anjo”.
A moça pegou minha mão e me disse que eu não me preocupasse, que seria carinhosa comigo. Fomos por um corredor e mais adiante entramos em um quarto. A moça começou a se despir enquanto eu olhava para ela e para a porta. Não sabia ao certo o que fazer, se continuava a observá-la ou se abria a porta e saia correndo.
A moça completamente nua fechou as cortinas e deixou o quarto na penumbra. Um bom tempo depois, saímos do quarto e fomos até onde meu primo estava. Minhas pernas tremiam. Meu primo olhou para mim e disse: “Não precisa falar nada. Estou vendo pela sua cara que você está parecendo um gato que acabou de comer um passarinho”. As moças riam a se acabar.
Ainda me refazendo da aventura limitei-me a beber um guaraná enquanto volta e meia uma das mocas brincava comigo dizendo que queria ser a próxima.
Daquele dia em diante me senti diferente. Nas rodas de amigos cada qual se vangloriava de sua primeira vez. Daí em diante tudo foi diferente.
Valdir Barreto Ramos, sub-oficial enfermeiro da Marinha do Brasil, Turma Lima de 1975 da EAMCE.