Mudei de casa. Foram anos que passaram nos quais acumulei experiência, maturidade, vivência. Riqueza, nem tanto. Louve-se a família que é o bem maior. Afora isso, poucos bens amealhar, o suficiente para manter uma qualidade de vida razoável.
Os filhos cresceram e se tornaram homens de bem. Tesouro maior para qualquer pai é vê-los bem e encaminhados na vida. A mulher amada, companheira e amiga me acompanha durante essa jornada. Luta bravamente para não entregar-se ao desgaste do tempo implacável. De mãos dadas seguimos pelos dias, pelos anos.
Ao longo do tempo os cabelos teimaram em desertar e me abandonar evidenciando uma calvície com poucos fios que teimavam em resistir bravamente ao deserto que a cabeça se tornou. Dos que ficaram, alguns embranqueceram com o tempo demonstrando que o tempo é intransigente e cobra evidência de sua chegada.
Mas chegou a hora. Não se pode evitar o inevitável. O corpo apresenta desgastes ocasionados pelo longo tempo que requerem mais atenção, respeito, paciência e maturidade. Agora é tempo de recordar o tempo que passou. Hora da colheita do que foi plantado.
Sim, mudei de endereço. Agora estou na casa dos setenta anos. Do tempo que me foi destinado, com certeza resta bem menos, só não sei quanto.
É tempo das dores, da limitação de movimentos, da vontade reduzida de fazer coisas. É tempo de rememorar as lembranças de tudo.
Das coisas boas e das ruins. As coisas boas, agradáveis recordações. As coisas ruins ficaram como aprendizados que foram usados para alicerçar as condutas.
Agora a preocupação principal é a hora do próximo medicamento. A alegria de estar com os netos, ler um livro, ver um filme, caminhar quando puder, passear, viajar, ver quantos por do sol for possível, enquanto o fim do tempo não vem. Valdir Barreto Ramos, poeta, contista, sub-oficial da Marinha, componente da Turma Lima da EAMCE- 1975.
